PORQUE A IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA NÃO ORDENA MULHERES PARA O SACERDÓCIO E EPISCOPADO?!
O Documento Papal Ordinatio Sacerdotalis propõe um dogma de fé?
Ou seja, as mulheres jamais podem ser ordenadas ao sacerdócio? O artigo abaixo, em forma de "disputatio", esclarece a questão:
Se o Papa fala infalivelmente
na Ordinatio Sacerdotalis?
• Objeção 1. Parece que o papa não fala infalivelmente na Ordinatio Sacerdotalis (1994). Pois, de acordo com o Cardeal Ratzinger: “Neste caso, um ato do magistério pontifício ordinário, em si mesmo não infalível, testemunha a infalibilidade do ensinamento de uma doutrina já possuída pela Igreja". [1] Portanto, como diz Sullivan: "Esta linguagem se aproxima muito daquela de uma definição solene, mas o Cardeal Ratzinger nos assegura que não era intenção de João Paulo II falar ex cathedra". [2]
• Objeção 2. Além disso, de acordo com o Arcebispo Bertone: "Parece um pseudoproblema questionar se este ato papal de ‘confirmar’ um ensinamento do magistério ordinário e universal é infalível ou não". Pois, embora não seja infalível por si só, participa da infalibilidade do magistério ordinário e universal, "que inclui o papa não como um mero bispo, mas como chefe do colégio episcopal". [3]
Pelo contrário, segundo o Papa Bento XVI: "O Beato Papa João Paulo II declarou de forma irrevogável que a Igreja não recebeu do Senhor nenhuma autoridade para isso". [4] E ainda: "O falecido Papa João Paulo II decidiu infalivel e irrevogavelmente que a Igreja não tem o direito de ordenar mulheres ao sacerdócio". [5]
Respondo que é preciso dizer que o papa fala infalivelmente na Ordinatio Sacerdotalis, quando diz: “Portanto, para que toda dúvida seja removida a respeito de uma questão de grande importância, uma questão que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do Nosso ministério de confirmar os irmãos (cf. Lc 22,32), declaramos que a Igreja não tem autoridade alguma para conferir a ordenação sacerdotal às mulheres e que este julgamento deve ser definitivamente mantido por todos os fiéis da Igreja". [6]
Há, como foi demonstrado, três condições necessárias para uma definição papal infalível. No caso da Ordinatio Sacerdotalis, não há dúvida de que a primeira condição (por parte do sujeito) é cumprida. Pois o Papa João Paulo II dirige explicitamente esta carta apostólica a todos os bispos da Igreja Católica e invoca o seu "ministério de confirmar os irmãos (cf. Lc 22,32)", recordando assim as palavras do Concílio Vaticano II, que cita a mesma passagem do Evangelho de Lucas onde se afirma que o papa é infalível quando: "como supremo pastor e mestre de todos os fiéis, que confirma os seus irmãos na fé (cf. Lc 22,32)…". [7]
No que diz respeito à segunda condição (por parte do objeto), a matéria em questão é explicitamente apresentada como "uma matéria que pertence à própria constituição divina da Igreja", que é necessariamente uma questão pertencente à fé. A confirmação disso aparece na resposta afirmativa da Congregação para a Doutrina da Fé à pergunta: "O ensinamento de que a Igreja não tem qualquer autoridade para conferir ordenação sacerdotal às mulheres, que é apresentado na carta apostólica Ordinatio Sacerdotalis para ser mantido definitivamente, deve ser entendido como pertencente ao depósito da fé?" [8] Pois uma doutrina que pertence ao depósito da fé é aquela que é revelada ou necessariamente conectada à revelação divina. Em ambos os casos, ela se enquadra no escopo da infalibilidade papal.
No que diz respeito à terceira condição (por parte do próprio ato), tem havido alguma confusão sobre a fórmula empregada pelo papa ao propor a doutrina como "a ser definitivamente mantida", uma vez que esta mesma fórmula é usada pelo Concílio Vaticano II para descrever o modo de ensino infalível do magistério ordinário e universal, enquanto o modo de ensino infalível próprio do papa é descrito no mesmo lugar como proclamar uma doutrina "por um ato definitivo". [9] Isso levou alguns teólogos a se perguntarem se o papa estava exercendo (ou tentando exercer) a infalibilidade do magistério ordinário e universal. Mas tal especulação não vem ao caso. Pois, como Ansgar Santogrossi mostra, [10] a declaração da Ordinatio Sacerdotalis é um exercício próprio da infalibilidade papal por direito próprio, como pode ser provado de duas maneiras.
• Primeiro, das palavras da 𝘳𝘦𝘭𝘢𝘵𝘪𝘰 de Gasser sobre a infalibilidade papal, pois a própria propriedade e nota de uma definição no sentido próprio é "a intenção manifesta de definir doutrina, seja de pôr fim à dúvida (floatationi finem imponendi) sobre uma certa doutrina ou de definir uma coisa dando um julgamento definitivo (definitivam sententiam) e propondo essa doutrina como aquela que deve ser mantida (tenendam) pela Igreja universal". [11] E essa intenção é manifesta na Ordinatio Sacerdotalis. Pois o Papa João Paulo II expressamente pretende remover toda dúvida, dizendo: "Portanto, para que toda dúvida seja removida". E ele o faz propondo seu julgamento (sententia) como "definitivamente a ser mantido (definitiva tenendam) por todos os fiéis da Igreja". [12]
• Em segundo lugar, é indiscutível que os bispos dispersos pelo mundo ensinariam infalivelmente se propusessem a mesma doutrina da mesma maneira — ou seja, como um juízo a ser definitivamente sustentado por todos os fiéis. Pois, de acordo com o Concílio Vaticano II, os bispos "dispersos pelo mundo, mas ainda mantendo o vínculo de comunhão entre si e com o sucessor de Pedro", são infalíveis quando "ensinando autenticamente questões de fé e moral, estão de acordo sobre uma posição (sententiam) como definitivamente a ser sustentada (definitive tenendam)". [13] Mas se alguém negasse que o papa também fala infalivelmente quando ele, como chefe da Igreja, propõe seu julgamento (sententia) numa questão de fé ou moral como definitivamente a ser mantida (definitive tenendam), então cairíamos no erro dos galicanos, segundo os quais os bispos têm uma autoridade de ensino maior do que o papa, contrariamente ao ensinamento solenemente definido do Vaticano I de que o papa possui a plenitude do poder supremo de jurisdição sobre a Igreja universal, que inclui o poder do magistério. [14] Portanto, deve-se admitir que o papa fala infalivelmente na Ordinatio Sacerdotalis.
- Resposta à Objeção 1. À primeira, deve-se dizer que a opinião privada do Cardeal Ratzinger não é decisiva. Nem o é a questão de se o Papa João Paulo II conscientemente entendeu ou não que estava falando ex cathedra. A questão decisiva é apenas se ele pretendia falar definitivamente, isto é, conclusivamente, sobre uma questão de fé ou moral, para toda a Igreja. E isso deve ser julgado à luz da intenção expressa no próprio texto, e não pelas opiniões privadas dos amigos ou conselheiros do papa, não importa quão bem informados eles possam estar de seus pensamentos e intenções privadas. Além disso, a afirmação de Ratzinger parece ser baseada na suposição de que o papa pode falar infalivelmente apenas quando define um novo dogma (ou doutrina), o que é falso, como demonstrado acima (Questão I, artigo 4).
- Resposta à Objeção 2. À segunda, deve-se dizer que não se trata de um pseudoproblema, mas sim de uma questão importante, perguntar se o ato pelo qual um papa confirma um ensinamento do magistério ordinário e universal é infalível ou não. Pois, na ausência duma definição solene, pode surgir a dúvida sobre se uma doutrina foi de fato ensinada definitivamente pelo magistério ordinário e universal, e isso de fato aconteceu com relação à questão da ordenação de mulheres. Nesse caso, um ato infalível de confirmação removeria todos os motivos de dúvida sobre a verdade da doutrina. Mas se o ato de confirmação não fosse infalível por si só, então o status definitivo da doutrina ainda repousaria no ensinamento do magistério ordinário e universal, que era precisamente o ponto em disputa, e assim as dúvidas de muitos não seriam efetivamente resolvidas.
Notas:
[1] Ratzinger, “Carta sobre a resposta da CDF".
[2] Sullivan, Fidelidade Criativa, 22.
[3] Bertone, “Documentos Magistrais e Dissidência Pública”.
[4] Papa Bento XVI, Homilia na Missa Crismal, 5 de abril de 2012.
[5] Carta do Papa Bento XVI ao Bispo William Morris, citada por Morris em Benedict, Me and the Cardinals Three: The Story of the Dismissal of Bishop Bill Morris by Pope Benedict XVI (Adelaide: ATF Press, 2014), 179.
[6] Papa João Paulo II, Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis (1994), §4. Nota: o texto oficial em latim usa o plural papal tradicional, mas o texto em inglês e italiano contido no site do Vaticano traduz "Nostri" e "declaramus" incorretamente como singular.
[7] Vaticano II, Lumen Gentium, §25.
[8] CDF, Resposta ao Dubium sobre Ordinatio Sacerdotalis (1995).
[9] Vaticano II, Lumen Gentium, §25.
[10] Ansgar Santogrossi, "Ordinatio Sacerdotalis: Uma definição ex cathedra", Homiletic and Pastoral Review (fevereiro de 1999): 7–14.
[11] Mansi, 52:1225 C.
[12] João Paulo II, Ordinatio Sacerdotalis, §4.
[13] Vaticano II, Lumen Gentium, §25.
[14] Ver Vaticano I, Pastor Aeternus, cap. 3.
Fonte: OnePeterFive.com
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